Insolvência culposa
O que é?
A insolvência é considerada culposa se tiver sido criada ou agravada em consequência da atuação, dolosa ou com culpa grave, do devedor, ou dos seus administradores, de direito ou de facto, nos três anos anteriores ao início do processo de insolvência.
Inversamente, será considerada como insolvência fortuita sempre que tal não se verifique.
Insolvência culposa e insolvência dolosa:
A insolvência culposa não se confunde com a insolvência dolosa: a insolvência culposa resulta do incidente de qualificação da insolvência do processo de insolvência regulado no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE) e só tem consequências civis ou patrimoniais (e não penais) ao passo que a insolvência dolosa constitui um crime regulado no Código Penal.
Contudo, os mesmos comportamentos podem simultaneamente dar origem à qualificação da insolvência como culposa e à abertura de um processo-crime por insolvência dolosa (o que, por vezes, acontece).
Pressupostos da insolvência culposa:
Considera-se que há insolvência culposa, por aplicação de uma presunção inilidível – que não admite prova em contrário (juris et jure) - sempre que os gerentes ou administradores, de direito ou de facto, do devedor que não seja pessoa singular tenham, nomeadamente:
a) destruído, danificado, inutilizado, ocultado ou feito desaparecer (dissipar, ocultar, sonegar, subtrair, materialmente e/ou juridicamente, através de transmissão, por exemplo, através de contrato de compra e venda, doação, permuta [troca]), no todo ou em parte considerável, o património da empresa;
b) criado ou agravado artificialmente passivos ou prejuízos, ou reduzido lucros, causando, nomeadamente, a celebração pela empresa de negócios ruinosos em proveito dos seus gerentes ou administradores ou em nome de pessoas com eles especialmente relacionadas;
c) comprado mercadorias a crédito, revendendo-as ou entregando-as em pagamento por preço sensivelmente inferior ao corrente, antes de satisfeita a obrigação;
d) disposto dos bens da empresa em proveito pessoal ou de terceiros;
e) exercido, a coberto da personalidade coletiva da empresa, se for o caso, uma actividade em proveito pessoal ou de terceiros e em prejuízo da empresa;
f) feito do crédito ou dos bens do devedor uso contrário ao interesse deste, em proveito pessoal ou de terceiros, designadamente para favorecer outra empresa na qual tenham interesse direto ou indireto;
g) prosseguido, no seu interesse pessoal ou de terceiro, uma exploração deficitária, não obstante saberem ou deverem saber que esta conduziria com grande probabilidade a uma situação de insolvência;
h) incumprido em termos substanciais a obrigação de manter contabilidade organizada, mantido uma contabilidade fictícia ou uma dupla contabilidade ou praticado irregularidade com prejuízo relevante para a compreensão da situação patrimonial e financeira do devedor;
i) incumprido, de forma reiterada, os seus deveres de apresentação e de colaboração até à data da elaboração do parecer do administrador judicial sobre a qualificação da insolvência como culposa ou como fortuita.
Incumprimento do dever de apresentação à insolvência:
Se o dever de apresentação à insolvência não for cumprido dentro do prazo, a Lei estabelece uma presunção ilidível (admite prova em contrário) de culpa grave sobre os gerentes ou administradores na criação ou agravamento da situação de insolvência da empresa. Ora, se os gerentes ou administradores não conseguirem ilidir esta presunção de culpa grave que sobre eles recai a insolvência será considerada culposa.
Incidente de qualificação de insolvência como culposa:
A qualificação da insolvência como insolvência culposa resulta da abertura de um incidente dentro do processo de insolvência, designado incidente de qualificação da insolvência.
Assim, o incidente de qualificação da insolvência é uma fase do processo de insolvência que se destina a apurar quais as razões que levaram à situação de insolvência, e consequentemente, se essas razões foram fortuitas ou antes correspondem a uma atuação negligente ou até dolosa (intencional) por parte do devedor.
Contudo, o incidente de qualificação de insolvência apenas é declarado aberto, se o juiz dispor de elementos que justifiquem a sua abertura.
Consequências / efeitos da insolvência culposa:
Na sentença que qualificar a insolvência como culposa o Juiz identifica as pessoas, nomeadamente os gerentes ou administradores, e fixa o respetivo grau de culpa. Para as pessoas que forem afetadas pela sentença de qualificação de insolvência como culposa, as consequências são, consoante o caso:
- inibição para administrar patrimónios de terceiros por um período de 2 a 10 anos;
- inibição para o exercício do comércio durante um período de 2 a 10 anos, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa;
- condenação na indemnização aos credores do devedor declarado insolvente no montante dos créditos não satisfeitos até às forças dos respetivos patrimónios, sendo solidária tal responsabilidade entre todos os afetados;
- perda de quaisquer créditos sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente detidos pelas pessoas afetadas pela qualificação e a sua condenação na restituição dos valores já recebidos no âmbito do pagamento desses créditos.
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